COLUNA MÁRIO BORTOLOTTO #5
[ foto/frame: Trip TV ]
ATORES
Tenho medo dos atores que se acham especiais. Dos que acreditam que têm uma missão. Daqueles que acreditam que personagens são "presentes". Presente, meu camarada, é aquele negócio que vem embrulhado num papelzinho bonito. Tenho medo de ator que elogia demais a "generosidade" dos "colegas". Eles vivem esperando o mesmo tipo de elogio. Dos que ditam regras sobre interpretação. Dos que seguem regras. Dos que têm medo de romper com as regras. Dos que acham que estão "arrasando" e dos que acham que estão "umas merdas". Tenho medo de atores que se satisfazem facilmente e tenho ainda mais medo daqueles que nunca estão satisfeitos. Dos que não relaxam . Atores "mudernos" me apavoram, mas o meu medo não é menor quando ouço atores defendendo tradições. Tenho medo de atores que levam outro atores demasiadamente a sério. Tenho medo de atores que esperam que o público os leve demasiadamente a sério. Sério é o que você tem a dizer, meu chapa, ou pelo menos, devia ser. Dos muitos vaidosos, dos exageradamente humildes. Alimento um profundo desprezo pelas unanimidades inatacáveis, eles deviam ter vergonha. Dos que estão acima da crítica. Dos incensados. Daqueles que garantiriam um lugarzinho no altar. Dos que esperam reverência. Dos que reverenciam. Dos que acham que têm muito a dizer. Dos que não se preocupam em ter algo a dizer. Tenho medo dos portadores da verdade (não existe porra nenhuma de verdade nesse negócio de interpretação). Bibliotecas de atores me provocam ataques de riso co m seus livrinhos de teóricos de teatro. Atores com métodos me apavoram. Desses que vomitam teorias em mesas de bar. É aconselhável manter distância deste tipo nocivo de sujeito. Fico longe de atores que se acham capazes de representar qualquer tipo de personagem. Desses que só falam de seu próprio trabalho, como se isso fosse o mais importante da vida. A vida é muito mais importante, irmãozinho. Tenho medo de atores que acham que camarim é igreja. Dos que morrem de inveja. Tenho medo dos que nunca enlouqueceram. Dos que nunca pagam pra ver. Dos que nunca se arriscam. Dos que esperam ser contratados. Dos não têm projetos pessoais. Dos que apenas têm projetos pessoais e vivem falando sobre eles. Dos que não realizam seus projetos pessoais. Dos que arquitetam desculpas para não realizar seus projetos pessoais. Dos que alegam que precisam sobreviver. Dos que vêem o tempo passar. D os que reclamam demais. Dos que esperam reconhecimento. Dos que exigem reconhecimento. Gosto dos atores que se arriscam, dos que carregam dúvidas, mas que mesmo assim não titubeiam, não entregam facilmente o jogo, dos que blefam, dos que não são ansiosos para mostrar o quanto bons atores eles são. Gosto de atores apaixonantes. Das pessoas apaixonadas. Dos que não têm pose. Dos que são capazes de falar tudo ao mesmo tempo. Dos que calam nos momentos que não têm nada pra dizer. Dos que erram. Gosto de atores que se arrependem. Dos que perdem o controle. Com esses, eu atravesso o inferno todas as noites e depois brindamos com cerveja as bundas dos anjos caídos que chutamos."
- Mário Bortolotto.
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